Com mix favorável ao açúcar, exportação do Brasil pode disparar 10 mi t em 20/21.
Por Roberto Samora e Marcelo Teixeira
SÃO PAULO (Reuters) - A situação atual do coronavírus e a guerra de preços de petróleo entre Rússia e Arábia Saudita devem tirar a competitividade do etanol frente à gasolina no Brasil, fazendo com que as usinas brasileiras destinem ainda mais cana para a produção de açúcar, com potencial de elevar o excedente exportável do país, segundo analistas.
Para Júlio Maria Borges, sócio-diretor da JOB Economia, essa situação dos mercados tem potencial de elevar a destinação de cana para o açúcar na safra 2020/21 para 46%, aumento de cerca de 10 pontos percentuais ante a temporada que se encerra agora em março.
Com um mercado global deficitário em mais de 9 milhões de toneladas, segundo projeção da Organização Internacional do Açúcar (OIA), já havia expectativa de que o Brasil se aproveitaria dessa situação do balanço de oferta e demanda, algo que pode ser acentuado.
“Estamos aceitando neste momento exportação maior de açúcar, na faixa de 10 milhões de toneladas (de aumento). O mix iria para 46% de açúcar, o que repete a situação de 2016”, disse Borges, explicando que os embarques do Brasil cresceriam para 29-30 milhões de toneladas, ante estimadas 19 milhões no ciclo que está se encerrando.
Ele comentou que, na medida em que deve faltar preço para o etanol atrair consumidores, com a gasolina ficando mais barata diante da derrocada dos preços do petróleo, a usina vai maximizar a produção de açúcar, “o que derruba o preço do açúcar em um segundo momento”.
Nesta quinta-feira, a Petrobras anunciou que reduzirá o preço da gasolina em 9,5% nas refinarias, a partir de sexta-feira, enquanto o do diesel cairá 6,5%.
Já o preço do petróleo Brent recuou cerca de 50% em 2020, com a queda sendo acentuada nesta semana.
O consultor ressalvou que, no momento, o dólar forte dá uma “proteção, pelo menos parcial” ao setor.
“Isso protege o açúcar, assim como protege o álcool da importação americana. É uma proteção parcial e pode ser temporária, porque este câmbio alto, ele é acima do equilíbrio, ele pode recuar. Se o ambiente econômico global se ameniza ao longo do tempo, esse câmbio recua.”
Outro atenuante é que as usinas já fixaram preços para a exportação de açúcar de quase toda a safra, e a cotações muitos boas, disse Borges. “Isso vai realmente ajudar.”
O sócio-analista da Agroconsult Fabio Meneghin concordou que o mix pode mudar se os preços do petróleo e da gasolina se consolidarem em patamares mais baixos, “talvez uns 4 ou 5 pontos percentuais a mais para o açúcar”.
Neste caso, haveria mais pressão sobre os preços e menor rentabilidade para as usinas, acrescentou ele.
MENOR CONSUMO DE ETANOL
Menos competitivo, o etanol hidratado (concorrente da gasolina) poderá sofrer uma redução no consumo após dois anos em que a demanda cresceu fortemente, atingindo um recorde em 2019, o que resultou em um baixo mix para o açúcar historicamente, o que acabou tirando o Brasil do posto de maior produtor global.
Claudiu Covrig, analista de açúcar da S&P Global Platts, disse que já reduziu a estimativa de consumo de etanol no Brasil em 2020 em 2,4%, estimando que 40% da cana será usada para produzir o adoçante.
Ao mesmo tempo, a Platts aumentou a projeção de demanda de gasolina em 7,5%.
“Mas se o mix de açúcar avançar para 42%, adicionando cerca de 1,6 milhão de toneladas de açúcar ao mercado, ou para 44%, adicionando 3,2 milhões de toneladas de açúcar, reduziremos mais a demanda do etanol hidratado”, disse Covrig.
O corte de preços da gasolina da Petrobras, apesar de grande, ainda está longe da queda nos preços do combustível nos Estados Unidos. Os futuros de gasolina dos EUA estão cerca de 20% mais baixos ante o valor da última segunda-feira, mostraram os dados da Refinitiv.
Os preços do açúcar bruto em Nova York estenderam as perdas após a notícia da Petrobras, caindo mais de 5% e atingindo uma mínima da sessão de 11,53 centavos de dólar por libra-peso. Os futuros reduziram algumas das perdas posteriormente.